quarta-feira, 19 de novembro de 2008

A reforma partidária que jamais farão (Helio Fernandes)

A cidadão-contribuinte-eleitor continuará votando na cúpula

É impossível comparar a competência, a eficiência, a influência e como conseqüência a popularidade dos diversos Congressos em 118 anos de República. O sistema político implantado com a derrubada do Império foi bastante deficiente. E a representatividade teve falhas gritantes.

A República foi uma traição ao imperador e ao povo, e portanto não podia ser o que tanto se esperava. Saldanha Marinho, uma das grandes figuras da época, durante 29 anos diretor do jornal diário "A República", ao ser preso, em 3 de novembro de 1891, deixou a frase que era um lamento: "Esta, realmente, não é a República dos nossos sonhos". Naquele dia 3, Deodoro fechava o Congresso, prendia centenas de pessoas, não tinha o menor compromisso com a República.

Aristides Lobo, grande jornalista, ministro da Justiça e republicano desde os grandes momentos de luta, afirmou para o "Jornal do Commercio" (então o maior jornal brasileiro), logo no dia 16: "O povo não soube de nada, a República chegou ao Poder sem povo e sem voto".

Como ditador, Deodoro só durou 20 dias. No dia 23 de novembro ainda de 1891, foi derrubado por Floriano. Este reabriu o Congresso, mas violou e violentou a Constituição. Teria que convocar eleições em 30 dias, ficou os 4 anos, i-n-c-o-n-s-t-i-t-u-c-i-o-n-a-l-m-e-n-t-e. E como Rui Barbosa anunciasse que iria pedir ao Supremo que tirasse Floriano do Poder, este mandou prendê-lo. Rui se exilou, Floriano governou com o Congresso aberto, mas foi um ditador.

Consolidada a República pela intuição e clarividência de Prudente de Moraes, vieram as eleições, mas inteiramente falsificadas. Todos, com exceção do presidente da República, precisavam ser RATIFICADOS por uma comissão designada pelo Executivo. Em diversos estados existiam 2 governadores, um que ganhara a eleição, outro RATIFICADO pelos que dominavam o Poder.

Em 1896 aconteceu o máximo em matéria de indignidade eleitoral. Eleito senador, Rui Barbosa não foi RATIFICADO por causa da influência de J.J. Seabra e de Manuel Vitorino (vice de Prudente), que tinham medo de Rui. Este só tomou posse por causa da bravura e do espírito público do governador Luiz Viana (o pai, o pai). Este gritou que não podiam cassar o maior brasileiro vivo, acabou vencendo.

O Congresso funcionou, mas não representava ninguém nem coisa alguma, desculpem o lugar-comum, era "uma colcha de retalhos". Os eleitos não tomavam posse, os que legislavam eram os RATIFICADOS e subservientes.

Não quero contar a verdadeira História do Brasil (devia) e sim mostrar como o Congresso pode e deve se reabilitar. Para isso tem que ficar aberto, mas sendo verdadeiramente a representatividade popular. Para isso precisam se aproximar do povo com uma eleição autêntica que surja da vontade popular. Têm que fazer, NÃO FARÃO a reforma política que o Brasil espera. Com alguns itens indispensáveis.

1 - Voto distrital.

2 - Número menor de deputados. Somos 513 numa população de 180 milhões. No outro grande presidencialismo, nos EUA, são 425 para 280 milhões de habitantes.

3 - Mandato menor, de 2 anos, o que aproxima o eleito do eleitor.

4 - Implantado o voto distrital, acaba esse indecente quociente eleitoral que elege candidatos com 20 mil votos e derrota outros com 100 mil ou mais.

5 - No Senado, mandatos de 6 anos, como estava na Constituição de 1946.

6 - Apenas 2 por estado, idem, idem na mesma Constituição.

7 - Fim do suplente, que só existe no Brasil. O modelo dos EUA é o que mais se aproxima da democracia.

8 - Introdução das convenções verdadeiras, e não reuniões tipo "convescote", nas quais se decide sem urna, sem voto, sem povo.

9 - Os Quércias, os Temer, os Jereissatis, os Azeredos e muitos outros decidem discricionariamente.

10 - Jogar para bem longe essa imoralidade maior que é a chamada "LISTA FECHADA".

11 - A cúpula sem representatividade faz a lista, coloca os nomes preferidos, e o povo nem sabe em quem está votando.

12 - É a nova versão para os "biônicos", criados por Vargas em 1933/1934 e repetida pelo também ditador Ernesto Geisel, em 1977, para a eleição de 1978.

13 - É uma violentação contra o cidadão-contribuinte-eleitor, que escolheria sem saber quem estaria escolhendo.

É evidente que o que apelidam de REFORMA POLÍTICA-ELEITORAL é um farsa, uma fraude, total mistificação. O povo será iludido mais uma vez, a representatividade, cada vez mais FALSA e mais FALSIFICADA.

Estes pontos são capazes de moralizar e autenticar as eleições. Mas não mudarão nada. Quem está disposto a abrir mão de seus benefícios? Se os partidos não existem, como aumentar o PODER de todos eles? E desprezar totalmente o eleitor, que votará no nada?

PS - Como voltaram a falar em REFORMA PARTIDÁRIA, também volto ao assunto. Querem "empurrar" no eleitor a famigerada votação em "lista fechada". Assim é melhor acabar com a eleição. Eleição?

PS 2 - Têm que reduzir o mandato dos senadores, 8 anos, o eleitor esquece em quem votou. E regularizar as eleições de prefeitos de pequenos municípios. Suplente de senador? Nunca mais.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

O andar de cima continua blindado

BRASÍLIA - Qual o saldo da reunião do G-20, no fim de semana, em São Paulo? Para a solução da crise econômica, nenhum. O presidente Lula tentou injetar ânimo e otimismo para evitar a recessão e o pânico mundial, lançou sobre os sete países ricos a responsabilidade do que acontece e sustentou a participação dos treze emergentes na condução de uma nova economia onde o peso do estado e dos poderes públicos prevalecerá. Em suma, decretou os funerais do chamado mercado.

Demonstrando que apesar de responsáveis pela crise de bobos não têm nada, os ministros da Fazenda e presidentes dos bancos centrais dos países ricos, ou seus prepostos, deram a volta por cima e neutralizaram a investida dos emergentes. Propuseram a abertura do leque, quer dizer, a ampliação do G-20 para G-40 ou G-50. Querem todo o tipo de sapos, lagartos e caranguejos no balaio. Se for para estabelecer uma nova economia mundial, que participem todos, não apenas os ricos e os emergentes. Resultado: uma nova Torre de Babel onde os homens, além de não falarem com os deuses, condenam-se a deixá-los em paz para continuarem mantendo seus interesses e dando suas ordens.

Em outras palavras, o mercado recusa-se a ser enterrado. Prepara-se para levantar do caixão, depois da catalepsia, e continuará mantendo e impondo seus privilégios. Fracassou a tentativa de os emergentes mudarem de piso, subindo até o andar de cima e deixando os subdesenvolvidos no porão.

Porque os deuses, mesmo sujos e esfrangalhados, determinaram que ou sobem todos ou não sobe ninguém. Como é impossível abrigar no Olimpo tantos despojados, despreparados e desestruturados, a conseqüência será que depois de múltiplas propostas de mudança não vai mudar nada.

A conta da lambança feita pelos ricos permanecerá sendo endereçada aos mesmos de sempre: eles e nós, ou seja, os subdesenvolvidos e os emergentes. O andar de cima continua blindado, uma evidência a mais de que o mercado nada mais é do que um clubinho de esnobes poderosos, dominando um universo de fracos.
O fracasso da reforma política

Determinou o governo que até sábado deputados e senadores dispõem de prazo para apresentar sugestões às propostas palacianas de reforma política. Depois, será iniciar discussões e votações que na melhor das hipóteses se estenderão durante todo o ano que vem.

Começa que mesmo podendo quase tudo o governo não poderá impedir a intervenção de parlamentares em qualquer etapa desse longo e frágil processo. Faz parte das mínimas prerrogativas que sobraram ao Congresso que seus integrantes apresentem emendas até o momento final da votação - senão não votam.

Acresce que a reforma política arrasta-se pelo menos há vinte anos, só nessa nova fase posterior à Constituição de 88, sem ter andado senão milímetros, mesmo assim por obra a graça do Judiciário. A razão surge simples: um legislador jamais legisla contra seus interesses. Passa por ingênuo quem supõe Câmara e Senado aprovando em definitivo, para valer, mudanças capazes de declaradamente prejudicarem a reeleição e a preservação de suas cada vez menores parcelas de poder.

Não haverá reforma política efetiva, mesmo diante de propostas pífias e incompletas apresentadas pelo governo. Senão vejamos nos textos encaminhados semanas atrás pelo Executivo.

Votação em listas partidárias fechadas nas eleições proporcionais, para deputado federal, estadual e vereador: essa proposta pode favorecer os partidos, a começar pelo PT. Em vez de votar no candidato de sua preferência, o eleitor se obrigará a respaldar uma relação preparada pelos caciques que dominam a legenda. Imagine quem eles colocarão nos primeiros lugares?

Mesmo assim, fica difícil a aprovação, porque muitos deputados, ainda que bons de voto, se porventura incompatibilizados com as chefias partidárias, serão colocados no fim da fila. Como só os primeiros têm eleição garantida, votarão sua própria sentença de morte? Isso sem falar na renovação, isto é, aqueles que querem entrar por algum fator de popularidade aceitarão ser discriminados?

Financiamento público das campanhas: o argumento favorável é de que, ao menos na teoria, estariam proibidos exorbitantes gastos de campanha por parte de candidatos ricos ou que se comprometerem a defender o interesse dos ricos. Por isso os cofres públicos financiariam as despesas. Nem que as eleições fossem disputadas apenas por anjos, arcanjos e querubins os candidatos deixariam de, por baixo do pano, utilizar recursos privados junto com recursos públicos.

A malandragem sempre consegue superar a lei, somando-se também a absoluta falta de meios para a Justiça Eleitoral fiscalizar o montão de candidatos. Acrescem ainda dois obstáculos. O dinheiro para as campanhas seria entregue aos partidos, ou seja, a seus caciques, que se encarregariam da distribuição. E a opinião popular, não pesa nada? Se não existem recursos para melhorar escolas e hospitais, se as estradas andam esburacadas, se o próprio governo precisou reduzir as verbas para as obras do PAC, como explicar a abertura dos cofres públicos para financiar a classe dos políticos?

Fidelidade partidária: há séculos que os políticos mudam de partido como se muda de camisa. Razões de ordem pessoal, eleitoral, política e às vezes até ideológica determinam o troca-troca tão a gosto dos que se mantêm à tona. Engessá-los, mesmo com a ressalva de poderem mudar de partido uma vez, antes de cada eleição, além de farsa constitui sonho de noite de verão. Jamais a maioria parlamentar admitirá restringir-se assim. Inelegibilidade para o candidato que tiver sido condenado na primeira instância do Judiciário.

Estivesse em vigor essa determinação e pelo menos um terço das cadeiras do Congresso ficariam vazias. Costuma ser burlada até a proibição de candidatar-se quem foi condenado em última instância, sem direito a nenhum outro recurso. Além de existirem manobras escusas por parte de adversários através da obtenção de denúncias e de sentenças vãs, mas capazes de prejudicar cidadãos honestos. O fato de alguém estar sendo processado não elide o princípio de que todos são inocentes até a condenação final.

Proibição de coligações partidárias em eleições proporcionais: O que seria dos pequenos partidos se impedidos de coligar-se para enfrentar os grandes? Existem exageros nesses casamentos de ocasião, com as legendas de aluguel que ressuscitam apenas às vésperas das eleições, até para vender tempo nos programas de propaganda gratuita no rádio e na televisão. Apesar disso, a soma dos votos de candidatos de legendas menores serve como válvula de escape para alguns.

Cortar liminarmente a cabeça de todos equivaleria a privar o Legislativo de importantes representações, além de privilegiar a ditadura dos grandes. E por que, então, continuar permitindo coligações em pleitos majoritários? Se a regra é saudável, deve valer para todos, mas aí a gritaria seria geral. Já imaginaram Dilma Rousseff candidata apenas do PT?

Cláusula de barreira impedindo a posse de candidatos a deputado que não tiverem alcançado 1% da votação geral para a Câmara ou o funcionamento de partidos com menos de 0,5% dessa votação em pelo menos nove estados: essa é uma das dezenas de fórmulas já sugeridas ou até aplicadas ao longo das últimas décadas em nossa legislação eleitoral, sendo que todas, sem exceção, têm sido revogadas ou abandonadas.

As minorias sempre encontram um jeitinho de não desaparecer e contam com as simpatias gerais, em especial das maiorias. Afinal, a gangorra está em cima, mas pode despencar. Também será difícil que na hora da decisão, se essa hora chegar, os deputados deixem de pensar no futuro.

Imprimir Indique para um amigo
Topo
Leia o Carlos Chagas de ontem

>